domingo, 23 de outubro de 2011

Suíte

Todos que me conhecem sabem onde trabalho, e que em função do meu honroso ofício vejo os mais variados tipos da espécie humana. Sabem também que apesar de ter me formado em Direito, tenho uma vontade imensa de entender como funcionam os mecanismos da mente humana, como cada um chega às suas conclusões (se chega), como engendram suas lógicas, enfim, tudo o que faz com que cada um tome as decisões características de sua personalidade. Por isso presto muita atenção a todos ao meu redor.

E a cada dia percebo que não existe laboratório melhor para estudar o tipo humano do que um Fórum de Justiça. É como se esse lugar fosse um ímã para pessoas de todos os tipos, desde as quase normais até as totalmente bizarras, passando pela classe dos lunáticos, psicopatas e psicóticos de toda espécie.

Dentre essas figuras existem os “clientes”, forma carinhosa que chamo aqueles cuja assiduidade merecia um cartão fidelidade do tipo Golden, pois comparecem todos os dias, faça sol ou faça chuva, discutem questões de direito (que, creio eu, aprenderam por osmose), contam suas felicidades, mazelas, e passam a fazer parte do meu cotidiano de tal forma que me sinto quase íntima deles, uma espécie de prima, ou algo assim.

E foi justamente de uma cliente Golden que, ao contar sobre o descaso de sua advogada em relação ao seu processo, narrou seu ato ousado de ligar para o Tribunal de Justiça e falar com o Desembargador encarregado de seu recurso. Foi mais ou menos assim:

- Acredita que ela (a advogada) não cuida do meu processo, deixa tudo a Deus-dará, e foi por causa dela que perdi a causa aqui com o juiz, mas daí recorri. Recorri e caiu na mão do desembargador fulano de tal, pois peguei o telefone e liguei pra ele. Mas pense numa pessoa querida, falei diretamente com nele na SUÍTE dele...

Nem preciso dizer que depois de ouvir a palavra Suíte, parei de ouvir o que ela falava e comecei a divagar como seria a Suíte Master Presidencial (sim, porque suíte de desembargador ainda mais no TJ não deve nada menos que quase divina). Imaginei um senhor meio fora de forma, já na casa de seus 70 anos, praticamente um menino da terceira idade, relaxando em sua banheira de hidromassagem, segurando com uma mão um copo com cowboy, e com a outra alguma protuberância do corpo escultural de sua assessora, sorrindo feliz, apoiando entre os dedos do pé um charuto cubano, que hora ou outra leva à boca (não me pergunte como ele tem essa elasticidade). Tem à sua esquerda uma portinha que leva a uma sauna; e à sua direita provavelmente um bar, guarnecido das bebidas mais caras e finas, onde bargirls fazem manobras no mínimo interessantes com garrafas de licor, e esperam o Sr desembargador requisitar um drink qualquer, sei lá, algo que vai desde coquetel de frutas até mesmo uma tequila. Atrás do bar uma porta levaria até uma pequena cozinha de onde saíam suas iguarias que apreciava juntamente com suas meninas, digo, estagiárias, todas coincidentemente bonitonas, trajando biquínis minúsculos.

Aquelas que não cabem na sua banheira, podem se divertir na pista de boliche que fica mais ao fundo, ou então podem jogar uma partidinha de poker ou roleta, no pequeno cassino que fica na portinha ao lado da sauna, pois são “esportes” que o Sr desembargador aprecia, afinal é necessário também espairecer...

É claro que este ambiente de respeito e descanso do Exmo, é cheio de jogo de luzes, e possui nos cantos barras americanas onde belas meninas fazem pole dance (exercícios ritmados para combater a LER). Mais ao canto uma cama ultra King (lembrem-se que estamos falando da Suíte Master Presidencial de um Desembargador dentro do prédio do TJ), para os momentos de descanso do nosso Exmo Desembargador, pois o pobrezinho se exaure com facilidade. No ar um cheiro que mistura sais de banho, bebida alcóolica, e algo mais... A música sensual, digo, relaxante, completa este ambiente tranquilo e sereno.

Quando acordei do meu devaneio fiquei imaginando o que faz alguém confundir gabinete com suíte? Entretanto, ainda envolta em minhas divagações, calculei mentalmente quanto tempo ainda faltava e quanto eu ainda teria que estudar para poder ter a minha própria Suíte no TJ, tal e qual a do nosso Desembargador, porém, claro, adaptada para as minhas necessidades femininas. Suspirei esperançosa, sussurrando “Senhor, não mereço tanto...”

Nenhum comentário:

Postar um comentário