sábado, 19 de junho de 2010

Sobre o Desapego



Quando se pensa em desapego, imagina-se logo um ermitão, vivendo de forma precária, sozinho, isolado, sujo e com ares de maluco, erguendo as mãos ou andando de braços abertos para mostrar que nada tem além da própria roupa e barba longa. Porém, ao longo do tempo, percebi que desapego nada tem a ver com renúncia e sim com a compreensão de impermanência. Não irei citar filósofos ou religiosos afinal meu objetivo não é provar nada e nem convencer ninguém, mas instigar a reflexão.

Então vejamos, por que se prega o desapego? Por que precisamos ser desapegados? A resposta é: para evitar o sofrimento advindo do desejo, sendo este resultado da ignorância. Para evitar o desejo não há a necessidade de “largar tudo” se isolar e renunciar às coisas que trazem conforto e permitem que a nossa passagem pelo mundo seja menos penosa. A questão é que devemos usar as coisas e sentimentos, e não ser usados por eles. Exemplifico: podemos ter casa, carro, roupas belas, um bom parceiro(a), um bom emprego, amigos, etc. Entretanto, se entendermos que tudo isso, absolutamente tudo terá um fim, que nada permanece pra sempre, então veremos que tais coisas, pessoas e sentimentos, fazem parte de nós, mas não somos tais coisas, pessoas e sentimentos. Tudo passa por nós, e nada, absolutamente nada nos pertence.

Equivoca-se quem pensa que o desapego diz respeito apenas às coisas materiais, ele abrange também nossas relações sociais, amorosas, nossos sentimentos e sensações. Há pessoas apegas ao seu carro, jóias, roupas, bens materiais, assim como há pessoas apegadas em amigos, amores, filhos, pais, rancores, trabalho, paixões, sensações, passado, futuro. Tem até quem seja apegado à conta bancária, mesmo sem gastar um tostão! Apegado a números!


Assim que entendo o desapego: não preciso renunciar ao mundo pra ser desapegada, o meu desapego entrará em cena no momento em que cada coisa, pessoa ou sentimento for sendo tirado ou indo embora. Não preciso esbanjar, não preciso me privar, não preciso me isolar e nem usar as pessoas... Preciso ser desapegada, pois no dia em que o dinheiro acabar, se algum dia tiver que mudar de emprego, de casa, quando perder meu carro e minhas belas roupas, quando meus amigos morrerem ou forem embora, quando o relacionamento acabar, a paixão passar, quando a dor machucar, enfim... Quando tudo cumprir com sua característica de impermanência, terei que ser desapegada para deixar partir sem me entristecer ou pelo menos sem achar que sem aquelas coisas ou pessoas não saberia viver, sem fazer daquilo a minha existência, sem mentir pra mim mesma que aquilo era tudo, que aquilo era eu.