quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Considerações Finais

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” (Rui Barbosa)

Estava pensando quais seriam as minhas considerações finais deste relatório, o último relatório do último semestre de Estágio Supervisionado, na penúltima fase do curso. Foi quando recebi por e-mail a citação acima e não consegui pensar em nada melhor para basilar estas linhas.

Quando iniciei o curso de Direito, não tinha real visão do que significa tal curso, tampouco o que um jurista significa na sociedade. Entretanto hoje, praticamente uma formanda, percebo que minha mente passou por várias etapas numa metamorfose constante em direção a uma visão mais ampla e cristalina e tenho certeza que tal mudança não cessou. A graduação vai perdendo a pompa e o peso da responsabilidade começa a fazer arcar os ombros, assim como a ingenuidade de esperar dinheiro fácil e a idéia de um profissional tal e qual a personagem John Milton do filme “Advogado do Diabo” também vão dando lugar a livros e a certeza de que riqueza deve ser mais uma conseqüência que um fim em si.

E agora leio a citação do incomparável Rui Barbosa e reflito acerca da minha própria conduta, dos meus anseios e do tipo de jurista que eu espero ser. Sim, porque o NPJ nos prepara, creio eu, para a vida de Jurista e não apenas para a vida de Advogado. O contato com a pobreza, miséria, descaso, doença, falta de educação e desrespeito das autoridades em relação à população; contato com pessoas que mal sabem o próprio nome, que não têm documentação, que possuem descaso pelo próprio corpo e consequentemente pelos filhos, que padecem por falta de remédio, de instrução, de respeito... Estas Marias e Joões que têm por maiores aspirações a saúde, o registro de nascimento, a pensão alimentícia para seus filhos, a dignidade. Estas pessoas, tenho certeza, abriram meus olhos para a realidade que irei enfrentar como Jurista.

Esta gente acostumada às injustiças, entediada com a desonra me fizeram pensar “que tipo de Jurista somos nós?”. Estaremos nós também desanimando da virtude, rindo da honra e tendo vergonha de sermos honestos? Seriam os juristas os responsáveis por essa descrença na Justiça? Onde estariam os verdadeiros Juristas? Será que se escondendo do crime organizado, seja ele do morro, da multinacional ou das câmaras de Vereadores e Deputados? Teria conserto esse mal que cresce a cada dia aprofundando suas raízes na sociedade como um câncer, que sufoca até a morte? Estaríamos condenados a um círculo vicioso?

A minha passagem pelo NPJ me causou pavor, pois vi que a moléstia social é larga e profunda, no entanto me recuso a acreditar que nada podemos contra as pragas que assolam o meio jurídico. Recuso-me a imaginar que terei que “entrar na roda” e que “espernear é perda de tempo”. Se escolhi ser jurista, então é Jurista que serei e não apenas uma manipuladora de leis. Afinal, como já dizia Fernando Pessoa “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”. Assim, se a paz é fruto da Justiça, esta por sua vez é fruto do trabalho de Juristas. Vai-se o período no NPJ, vem o mundo, a vida real e todos os seus encargos e eu me sinto preparada pra eles.



(Considerações finais do meu último relatório do Núcleo de Práticas Jurídicas na 9ª fase do curso de Direito. Lendo tais considerações acabei me questionando se seriam mesmo Considerações finais ou Prolegômenos...)